quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Minha Breve Experiência com um site de "tráfico de pessoas" na DW.

Print tirado do site Black Death, depois da mudança de endereço.

“O lance inicial de Nicole é de 150.000$”, dizia o anúncio. A garota — magra, loura e com a parte de cima do corpo nua — parecia se debater nas fotos. Com os braços amarrados para trás e a corda ligada a uma outra estrutura, “Nicole” se atirava para a frente enquanto ao fundo pairava a sombra de um homem.

O anúncio do leilão incluía o tamanho do busto de Nicole, seu peso e o fato de que não tem nenhuma DST. Ela estava sendo vendida na deep web em um site administrado por um grupo que se apresenta como “Black Death”.

“Estou interessado na garota”, eu disse aos donos do site em um email criptografado, “quero ver mais fotos”. Não demorou para que recebesse uma resposta.

***

Encontrei o Black Death depois de ver um link no Reddit. “Pelo jeito é um grupo criminoso organizado que faz de tudo que você pensar”, dizia o post.

Quando se depara com o site, os usuários se veem diante de uma série de diferentes serviços e produtos: armas, drogas, assassinatos, novas identidades e tráfico. Um feed com notícias de anos atrás também estava disponível. “Black Death chega à Deep Web”, diz o site em 27 de janeiro de 2010. “E estamos aqui pra ficar.” Ao que tudo indica, a página mudou de endereço diversas vezes. “O faremos sempre que estivermos ficando muito populares”, afirmava o texto.

“Não entre em contato só para fazer perguntas”, continuava a apresentação do site. Para ver o que poderia descobrir sobre os tais traficantes de gente da deep web, decidi me passar por possível cliente.

“Quem é você? Como sabe de nós? Quem nos recomendou?”, latiram os donos em seu email de resposta.

Pouco depois de ter contatado o grupo, outra garota foi adicionada ao site. O lance inicial para ela era de US$180.000. Todas as fotos eram de alta qualidade e tinham iluminação dramática. Nenhuma delas tinha qualquer metadado e uma busca reversa não resultou em nada.

Print do site antes da mudança, censurei os rostos e a nudez.

Escrevi de volta ao Black Death. Afirmei agir como intermediário entre diferentes empreendimentos.

Eles não botaram fé. “Boa tentativa, Europol [o serviço europeu de inteligência]”, responderam.

Depois de mais algumas mensagens em que criei evidências de que possuía centenas de dólares em Bitcoin, o Black Death deixou claro que não queria nada comigo.

“Não nos incomode mais”, escreveram. Então o site sumiu. “O Black Death mudou”, dizia um aviso.

Depois de manter o diálogo por emails, enfim me deram uma lista de instruções para seguir adiante no leilão. Exigiram-me um depósito adiantado para ter acesso a um streaming ao vivo das garotas. Tentei negociar para que não me cobrassem, mas meu pedido foi negado.

***

“A deep web, como é conhecida, não é um lugar do qual pegamos muita coisa”, afirmou um conselheiro tático do Centro de Tráfico Humano do Reino Unido (UKHTC, na sigla original), integrante da Agência Nacional de Combate ao Crime (NCA). A NCA pediu que não citássemos o nome do conselheiro pois se trata de informação que não é de conhecimento público.

Ele disse que a UKHTC havia encontrado sites parecidos, que vendiam escravos e escravas, muitas vezes com indícios de que as vítimas estavam sendo utilizadas em esquemas de prostituição em sites mais abertos. De fato o comércio de pessoas na rede não é novidade. Redes sociais e demais páginas tem sido usadas como facilitadoras há anos.

Fora as fotos chocantes, não havia nenhuma grande diferença entre o site do Black Death e dos sites de leilões já conhecidos pela UKHTC, disse o conselheiro.

"Não creio que se você enviasse o dinheiro iria reavê-lo de alguma forma.”

Mas os especialistas não estão convencidos de que o site era legítimo. Foram as fotos brilhantes e de alta qualidade que levantaram suspeitas por parte do conselheiro da UKHTC. Para ele, é uma “possível armação”. Em outros sites, as pessoas comercializadas “não são glamourizadas como estas garotas”, comentou.

Há outros problemas com o site. “O esquisito é que eles revelam onde elas foram capturadas e onde estão”, disse. No site consta que vítimas norte-americanas foram raptadas em Paris. “Creio que haveria cobertura da grande mídia em torno do desaparecimento de cidadãos norte-americanos na Europa”, disse.

“Não creio que se você enviasse o dinheiro iria reavê-lo de qualquer forma”, afirmou. Os donos do site afirmaram usar serviços de caução no passado — em que um terceiro cuida das transações para que ninguém saia lesado — mas deixaram de lado após dificuldades com valores mais altos.

Provar que o Black Death é real ou falso é impossível sem maiores informações. Se era um golpe, eles dificultaram com que eu lhes desse dinheiro. Se era sério, por que fazê-lo na deep web se o negócio funciona bem na rede normal?

Tráfico humano é um dos mitos mais citados da deep web, mas raramente é acompanhado de provas. Por alguns breves instantes, consegui chamar a atenção de alguém que afirmava vender gente ali — independente de ser verdade ou não.

“Não convidamos desconhecidos para leilões”, disseram-me via email. “Não queremos popularidade. Nada de Europol. Nada de curiosos, jornalistas ou blogueiros”.


“Apenas negócios.”



É ISSO, ATÉ A PRÓXIMA!
INSÔNIOS'

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